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Em ‘Gigante Gentil’, Erasmo Carlos canta o romance virtual e real

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RIO — Em suas andanças pelo Twitter, Erasmo Carlos se assustou com a agressividade — frequente na rede social — dos comentários a seu respeito. Termos como “zumbi”e “morto-vivo” eram associados a ele, ao lado de piadinhas como “se Erasmo levantar o braço, Deus puxa”. A indignação gerou a canção “Gigante Gentil”, de versos como “Mas quando dizem que o gigante é um morto-vivo/ Perdido como um bicho sem carona no dilúvio/ Me assusto com o olho podre que vê ele assim/ Detonam o gigante e o estilhaço pega em mim”.

— Não é uma resposta raivosa — explica o compositor. — Inicialmente havia a coisa do “onde está o respeito pelo artista Erasmo Carlos?”, mas depois entendi que isso sempre existiu, a gente só não ficava sabendo. Hoje até acho graça de algumas piadas.

A canção batiza, abre e é a faixa de trabalho de “Gigante Gentil” (Coqueiro Verde), novo disco de Erasmo, com dez faixas inéditas do compositor, só ou com parceiros — seu clipe pode ser visto em www.erasmocarlos.com.br. Mais que isso, ela mudou o rumo de um álbum que se chamaria “Amor” — completando a trilogia que já teve “Rock’n roll” (2009) e “Sexo” (2011). Foi a partir da música também que o artista idealizou a capa, do designer Ricardo Leite. Nela, em traços de HQ, aparecem três Erasmos: um menor, vestido como um guerreiro; outro gigante, protegendo o menor em suas mãos; e um enorme, bestial, que observa os outros dois. Cercando os três, há uma horda de pequenos demônios.

— O gigante é o Gigante Gentil, o artista, que está defendendo o Erasmo Esteves — explica. — Os demoninhos são as coisas do mundo, as pessoas que estão me atacando. E o monstro é o meu lado mau, que também está nesse processo de atacar, de destruir. Já me peguei fazendo isso que as pessoas fazem comigo. Ninguém é melhor do que ninguém.

Caetano e Nelson Motta entre os parceiros

O apelido Gigante Gentil acompanha Erasmo desde a década de 1980. Criado por Lucinha Turnbull, ele representa a síntese da “fama de mau” do artista com sua personalidade doce e sua generosidade sem afetação ou estrelismos.

— Sou alto. Não sou bonito, mas tenho cara de macho alfa. Uma cara de bandido que fazia com que as mães não me quisessem como marido de suas filhas — brinca o cantor de 72 anos. — Minha vida também não era comportada. Mas mesmo tendo essa imagem de bad boy, ou bad old man hoje, todos que me conhecem dizem que eu sou gentil, legal. Não me lembro de ter inimigos, bicho.

As formas de relacionamento nascidas com as redes sociais, tema presente na origem da canção “Gigante Gentil”, surgem coincidentemente em outras duas músicas. “Amor na rede”, melodia de Erasmo com letra de Nelson Motta, fala de um romance nascido virtualmente (“Você me piscou um olho e me mandou um beijo/ Me encontrou no Facebook e me adicionou/ Viu o meu perfil, curtiu, caí na sua rede”) e que se consuma no mundo real (“Até o dia em que te amei na minha rede/ Matei a minha sede à luz de estrelas”). E o próprio Tremendão havia feito “Colapso”, a descrição de um cenário apocalíptico, tema já visitado por ele em canções como “Apocalipse” e “1990 — Projeto Salvaterra”, desta vez com imagens como “a comunicação morreu” e “desnorteados, crentes e ateus sem Facebook não encontram Deus”. Mas o personagem da canção, em meio ao caos, só tem um pensamento: “Eu aqui tentando/ Morto de pavor/ Desconectado/ Falar com o meu amor”.

— É como “Quero que vá tudo pro inferno”, o que se diz ali é “quero meu amor e foda-se o mundo”. Não tem hipocrisia, porque é assim. Era naquela época, é hoje. Mudam o lugar onde você está, a idade, os costumes, mas o amor é o mesmo — diz o artista, que define sua situação amorosa atual com um “meu coração está comprometido”.

O disco, portanto, não cai longe do seu alvo de origem, aquele que completaria a trilogia: o amor. O tema atravessa “50 tons de cor” (inspirada no best-seller “50 tons de cinza”); aparece sob o olhar da filosofia em “Coisa por coisa” (que cita Aristóteles e fala da impossibilidade de se definir as fronteiras entre amor e paixão); é descrito em “Sentimentos complicados”, parceria de Erasmo com Caetano Veloso, a primeira da dupla; está já no título de “Manhãs de love”, feita com Arnaldo Antunes (a dupla assina também “Teoria do óbvio”); surge como guia maior em “Moça” (“Não é um conselho, é uma observação para as moças, dizendo que no amor elas têm que deixar os conselhos de lado e seguir o coração”, descreve o artista); vem como uma mulher personificada na natureza em “Caçador de deusas"; e é revisitado na faixa-bônus, o sucesso “Além do horizonte”.

O disco é produzido por Kassin, com uma banda que inclui o guitar hero Luiz Carlini, os teclados e o acordeom de Marcelo Jeneci e a guitarra de Smokey Hormel (Johnny Cash, Tom Waits, Beck). O resultado é “com uma pegada menos rock’n’roll”, mas com outros timbres e camadas. No palco (a estreia carioca é no dia 24 de maio, no Vivo Rio), Erasmo apresentará as novas ao lado de clássicos e lados B. Alguns em diálogo direto com seu momento conectado.

— “A carta” é o antigo e-mail. Mas mais romântico. Porque era mais difícil, e o que é mais difícil é mais romântico. A conquista era mais romântica porque existiam a anágua e aquele sutiã cheio de coisas.


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