RIO - Caetano Veloso compôs “A bossa nova é foda”, que deu origem à “O hip hop é foda”, escrita por Rael e interpretada por Emicida. Eis que a canção-resposta gerou uma parceria entre os músicos, que vão se apresentar juntos no Prêmio Multishow na próxima terça-feira, às 22h, na Arena da Barra, no Rio de Janeiro. Caetano e Emicida no mesmo palco não chega a surpreender, já que o baiano setentão flerta com rap e hip hop desde o início dos anos 1980. Prestes a realizar o primeiro ensaio, a dupla conversou com O GLOBO e deu detalhes de como será a apresentação, que vai ter as duas canções “fodas”, além de “Tropicália” e “Abraçaço”. Em seu Twitter, Caetano divulgou um vídeo do trecho dos preparativos com Emicida.
Como surgiu a ideia da canção-resposta, que acabou dando origem ao dueto que será apresentado no Prêmio Multishow?
Emicida: A gente foi para o show do Caetano em São Paulo. Quando Rael ouviu “A bossa nova é foda”, ele ficou maluco e falou que precisava fazer a versão do hip hop. Eu achei que ele estivesse brincando, mas não é que ele realmente fez a música?
Quem é mais “foda”? Pop, rock, bossa nova, hip hop, rap...?
Caetano: Eu acho que cada um é absolutamente foda no seu campo, mas todos os movimentos ecoam uns nos outros. Eu sou um fã muito precoce desse negócio de rap e hip hop. Quando esses meninos aqui nem eram nascidos, no início dos anos 1980, eu vi um filme sobre a cultura rap e fiz a música “Língua”, que é meio falada, rimada, com um refrão cantado pela Elza Soares. Tive interesse porque achei muito significativo.
Vocês também vão cantar “Tropicália” e “Abraçaço”. Por que essas canções foram escolhidas?
Caetano: “Tropicália” eu que escolhi, eu queria cantar. Ultimamente, quando me pedem para fazer algo especial, eu sempre escolho “Tropicália”. Nesse caso específico tem a ver, porque “Tropicália” foi a canção que eu mesmo fiz e que me provocou uma abertura de mente para ver esse filme americano, que não lembro o nome (risos), sobre a cultura hip hop. Se eu ficasse naquela mesma onda que eu estava em 1964, 1965, eu nunca teria ido ver um filme sobre hip hop nos anos 1980.
Como vai ser a apresentação? Cada um canta um trecho do outro? Ou de sua própria música?
Emicida: Acho que vai ser o que chamamos no hip hop de mixtape, que é um intervalo muito pequeno entre uma faixa e outra. Até porque temos pouco tempo, de seis a oito minutos.
Caetano: É a primeira vez que estamos nos reunindo para ensair. Ainda vamos pensar em como fazer. Mas acho que as canções vão ser emendadas.
E pode ser que saia uma turnê em conjunto? Ou um disco em parceria?
Emicida: Vocês gostam de colocar a gente pra trabalhar, hein (risos). Ainda estou me acostumando com a ideia de fazer um show com Caetano. Demorei uns três dias para acreditar quando fizeram o convite.
Caetano: Já estamos navegando um no repertório do outro. Mas também fiquei muito contente.
Caetano, você em algum momento da carreira achou que já tinha feito todas as parcerias possíveis ou acha que sempre tem gente interessante surgindo na indústria musical?
Caetano: Tem muita gente nova com quem eu desejo fazer parceria, ou de cujo trabalho eu desejo me aproximar. E tem gente mais velha com quem eu nunca colaborei, mas que desejo fazer parceria, como o João Bosco. Nós nunca fizemos nada juntos.
Emicida lançou seu primeiro disco, 'O glorioso retorno de quem nunca esteve aqui', há cerca de um mês e já virou alvo de polêmicas. Na canção “Trepadeira”, que tem participação de Wilson das Neves, ele diz “E os mano me falava que essa mina dava mais do que chuchu / Dei todo amor, tratei como flor, mas no fim era uma trepadeira”. Ao longo da carreira, Caetano já foi alvo de muitas críticas. Você tem algum conselho sobre como Emicida deve lidar com as polêmicas?
Caetano: Eu gostei da “Trepadeira”, porque ela é frondosa (risos). A canção é uma canção. Ela chega com a força que tem. As discussões paralelas passam, somem e a canção fica. A canção ao mesmo tempo desencadeia debates e ela própria é a resposta a todas as discussões.
Emicida: A música é um desenho de uma mulher livre. A interpretação que algumas pessoas tiveram é que ela poda a liberdade sexual da mulher. Mas na verdade ela fala sobre um homem com o dor de cotovelo. A mulher sambou em cima do coração dele e foi embora feliz. Quem ficou triste foi o cara. Não entendi essa polêmica.
Como é fazer uma apresentação em um evento que conta com uma plateia que não é 100% de fãs da sua obra, que é mesclada de fãs dos diversos gêneros?
Emicida: Vou para me divertir no Prêmio. Claro que é muito melhor se apresentar num palco quando todas as pessoas do público estão voltadas para a sua música, querem ouvir o que você está apresentando. Às vezes não é o que acontece numa cerimônia. Mas acho que numa oportunidade como essa para mim, para o Caetano e toda essa banda aqui, a energia no palco é sempre muito especial. Espero que todos possam apreciar com o mesmo afeto que estamos fazendo essa parceria aqui.