TORONTO — Passa longe de “Coração valente”, o arrasa-quarteirão de Mel Gibson sobre William Wallace e a luta pela independência da Escócia no século XIII. Mas “Legítimo rei”, que fez algum barulho no circuito de festivais e chega nesta sexta-feira ao streaming da Netflix, volta ao mesmo período histórico para contar a história de Robert “the Bruce”, ou Robert I, rei da Escócia entre 1306 e 1329, papel de Chris Pine. O diretor David Mackenzie batizou seu longa, pouco apreciado pela crítica americana, de “épico ultrarrealista”. Pense em muitas cenas de batalhas medievais, sangue e a lama escura da sempre chuvosa Grã-Bretanha. Ator e diretor trabalham afinados e estiveram juntos no faroeste modernoso “A qualquer custo”.
— Tentei fazer agora um híbrido de épico com um drama mais intimista. A intensidade e as dimensões são, de certa maneira, como as de um faroeste clássico — diz o escocês Mackenzie.
TVO filme começa com os nobres antes liderados por Wallace decidindo o que fazer contra Eduardo I da Inglaterra. E mostra a ascensão política e moral de Robert e a dificuldade de se unir as elites do norte e do sul da Grã-Bretanha. Para os fãs do filme de Gibson, vencedor de cinco estatuetas do Oscar em 1996, incluindo melhor filme e diretor, vale muito prestar atenção em quando e de que maneira Wallace surge em “Legítimo rei”.
— Costumo chamar o que David faz de “filme-jazz”, porque há uma estrutura, claro, um roteiro, mas parte-se daí para uma improvisação bem livre. Até porque, no meu caso, não existe uma análise psicanalítica ou uma autobiografia escrita por Robert “the Bruce”. Mergulhei em livros e livros de História para entender o homem e o tempo em que ele vive, mas em muitos momentos o instinto é que definia minhas ações e falas, o que David chama de “erros bem-vindos” — diz Pine.
Intrigas de cortes, rixas motivadas por estereótipos mais ou menos críveis, paixões proibidas, figurino luxuoso, armaduras potentes e uma muy falada cena do protagonista-galã saindo de um lago sem roupa dão algum ritmo a uma das apostas este ano da Netflix em uma superprodução com tiques da era de ouro dos estúdios de Hollywood. A crítica americana, no entanto, se irritou com o sabor vintage de Mackenzie. O “Washington Post” escreveu que o longa termina como um libelo pela libertação de duplo sentido. No filme, a dos escoceses. E, na vida real, a do público, finalmente livre de uma história monótona e excessivamente violenta.
— Por coerência, as cenas de batalha são mesmo o mais realistas possíveis, com as informações que conseguimos sobre a vida medieval. É, obviamente, para mim, um filme para ser visto no cinema. Porém, com a Netflix, tenho algo que jamais tive antes com um filme meu: a oportunidade de lançar o filme simultaneamente em 191 países mundo afora — diz Mackenzie, que conclui: —Entendo que há uma torcida de nariz para o que o streaming pode fazer com o cinema, mas para mim este processo é uma oportunidade de fazer parte de uma vanguarda estética. Não há a menor possibilidade de que um estúdio convencional financiasse, hoje, um filme como este.
O repórter viajou a convite do Festival de Cinema de Toronto