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Vanessa da Mata celebra pós-feminismo em novo disco

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RIO — A perspectiva que atravessa “Segue o som” (Sony), novo disco de Vanessa da Mata, é marcadamente feminina. Natural que seja assim, afinal a cantora é mulher e mãe — e tem uma história familiar repleta de mulheres fortes, como ecoa em seu romance de estreia, “A filha das flores”, lançado em 2013. De qualquer forma, é difícil ignorar a força feminina num disco que abre com a canção-enunciado “Toda humanidade veio de uma mulher”, remonta com graça à figura da avó (“My grandmother told me”), evoca o poder dos quadris (“Rebola nêga”) e avalia o amor, essa equação de encontros e desencontros com olhos de doçura e agudeza de... mulher.

— Nunca tive essa inveja do pinto de que Freud falava — brinca a cantora. — Gisa (personagem principal de “A filha das flores”) é feminista, eu sou pós-feminista. Ela tinha que reivindicar as coisas, eu já tenho. Meu primeiro disco já tinha esse direito de estar e ser mulher. Essa minha mulher, a das minhas canções, é forte. E, por outro lado, presencio a insegurança masculina, o homem está frágil em sua virilidade psicológica.

O homem, coadjuvante do álbum de Vanessa — que se separou após anos de relacionamento (“Não teve drama, foi tão bem desenrolado que nem influenciou o disco”) —, aparece muitas vezes refletindo essa fragilidade. Ele é alvo dos “toques” da compositora, que assina 12 das 13 canções do CD: “Vai ver que sou uma menina/ Só quero me divertir/ (...)/ Vai ver que sou uma menina/ E é capaz de me fazer feliz”; “Dramas são sempre enrolados/ Tome mais cuidado/ Não vá sem razão”; “Não vejo um sorriso verdadeiro por aí/ Acostumado a mentir/ Quem mente para todos mente para si”.

Teclados e “grooves”

O tema corta o disco, aparecendo de forma evidente em “Ninguém é igual a ninguém” (“O mundo capital/ O marketing da aparência superficial/ A contramão do amor puro/ O fast-fode, o jato do alívio”) e “Homem invisível no mundo invisível” (“Nesse consumismo/ Plastificado o rosto, amor, religião”). De forma mais sutil, ele está presente na defesa do rebolado de “Rebola nêga” e na leveza do gingado existencial, da escolha pelo caminho da suavidade de canções como “Um sorriso entre nós dois” (“Não pense em segurar, a vida tem asas”).

Como sonoridade, tudo isso se reflete na exuberância de teclados e variações de grooves (do carimbó-tecnobrega de “Se o presente não tem você” ao indie rock contemporâneo de “Por onde ando tenho você”, da trilha de musical mezzo-Julie-Andrews-mezzo-Björk de “My grandmother told me” ao reggae de “Homem invisível no mundo invisível”) . Por trás da arquitetura de timbres e ritmos, estão os produtores Kassin e Liminha.

— Desde o início tinha essa ideia de trazê-los, juntar duas pessoas fortes na minha carreira. Eles são completamente diferentes, mas complementares. Pelos pedaços de canções que eu vinha compondo (durante a turnê que fez em tributo a Tom Jobim, que gerou um álbum), já percebia que seria um disco diferente do (anterior de inéditas) “Bicicletas, bolos e outras alegrias”, que era mais contemplativo, com um lado africano acentuado. Este tem mais experimentação. Kassin tem muito isso. Liminha tem o suingue, faz a base de baixo e bateria bem estruturada. E a base carrega a sexualidade, a sedução — explica Vanessa, novamente puxando o disco para o rebolado feminino. — Cheguei com referências, mostrando coisas que achei que pudessem servir ao disco como (o cantor americano de r&b) Miguel, Marvin Gaye, Police, UB40, Black Uhuru...

Além de ter composto sua primeira música em inglês, “My grandmother told me — Tchu bee doo bee doo” (“Ela entra nesse universo romântico brega que adoro e fala daquele momento da paixão no qual você exagera, ouve Bryan Adams e chora”), Vanessa dá sua versão para o clássico de flashback “Sunshine on my shoulders”, sucesso com John Denver:

— Fiquei esperando que Kassin ou Liminha me dissesse: “John Denver?”. Mas não disseram. Porque a princípio parece muito diferente do meu universo, mas não é. Sou do Mato Grosso. Essa canção me remetia a um universo sertanejo, ao mesmo tempo pop, que entra na gaveta de um “Na rua, na chuva, na fazenda”.

Estreia no Circo Voador

Num álbum marcadamente feminino, a figura mítica que surge na canção “Homem preto” serve quase como um guia. Feita em homenagem ao avô de Vanessa — negro que se casou com uma branca numa época em que o casamento inter-racial era um tabu mais forte do que o que ainda se pode presenciar hoje —, a música traz versos como “Há um homem preto/ De olhos machucados/ Que habita um terno azul/ No meu peito”.

A canção estará no show de lançamento no Circo Voador, no próximo dia 25, que terá um rap exclusivo de Emicida na abertura. Vanessa está tranquila com a estreia na casa:

— Saí do Mato Grosso com 14 anos, não vou ter medo do Circo Voador — diz, rindo. — Circo é o mais fácil, é aberto para quem quer se jogar, dançar. As casas de shows com mesas É que são mais delicadas, porque estimulam uma postura mais analítica.


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