NOVA YORK - Enquanto o público se acomoda em seus assentos para ver “A biblioteca”, nova peça em cartaz no Public Theater, em Nova York, escrita por Scott Z. Burns e dirigida por Steven Soderbergh, sua atriz principal, Chloë Grace Moretz, já está no palco. Interpretando uma vítima de tiroteio numa escola que acorda no hospital e precisa lidar com lembranças traumáticas, Chloë, de 17 anos, passa entre dez e 15 minutos deitada em silêncio numa mesa antes do início da sessão, concentrando-se na personagem e tentando ignorar o burburinho dos espectadores.
— É meio esquisito — diz ela, revirando os olhos sarcasticamente. — Eu ouço “esquecemos de fazer reservas para hoje à noite” ou “o jantar foi US$ 400” e penso “meu Deus, cala a boca, cara!”.
Mas isso é o máximo de petulância juvenil que se pode extrair de Chloë, uma atriz extraordinariamente equilibrada, com um currículo de filmes — a sátira a super-heróis “Kick ass — Quebrando tudo”, a fantasia “A invenção de Hugo Cabret” e um remake sanguinolento de “Carrie, a estranha” — e uma postura madura comparáveis aos de artistas com o dobro de sua idade. Numa indústria povoada por Mileys, Justins e Lindsays descontrolados, na qual completar 18 anos significa se livrar das inibições, das roupas e da relevância, Chloë pode ser capaz de escapar dessa sina.
Seus parceiros em “A biblioteca” dizem que ela já está incrivelmente preparada para lidar com realidades de adulto e com grandes responsabilidades artísticas.
— Ela é muito centrada, sensata e ciente do que precisa ser feito — descreve Soderbergh, diretor oscarizado de “Traffic”, “Erin Brockovich — Uma mulher de talento” e “Onze homens e um segredo”.
Chloë, que faz sua estreia no teatro com a peça, observa:
— Estou muito confiante em mim mesma. Mas, ao embarcar nisso, estava insegura como jamais estive. Isso me instigou.
Numa tarde de abril, ela se encontrava no restaurante do teatro (cujo nome também é “Biblioteca”) acompanhada da mãe, Teri, e de um assessor sentado numa mesa distante, enquanto se comparava a outras pessoas de sua idade.
— Jovens de 17 anos lidam com, tipo, problemas emocionais. Eles são volúveis e confusos. Tudo é um processo para eles. Não estou dizendo que eu não sou assim. Sou muito assim. Sou temperamental, e coisas acontecem, e minha mãe pode confirmar isso — afirmou ela, enquanto Teri Moretz anuía com a cabeça.
O que a torna diferente, em sua opinião, é a capacidade de distinguir dois mundos:
— Minha vida e meu emprego. E eu nunca misturo os dois.
Ela vem aprendendo a agir assim desde que entrou no showbiz, aos 5 anos, e ganhou notoriedade em filmes como “(500) Dias com ela”, “Deixe-me entrar” e “Kick ass”, no qual interpretou uma justiceira adolescente com a boca suja.
Ao promover esse filme, aos 13 anos, Chloë divertiu um repórter numa entrevista ao encaixar performances de músicas de Lady Gaga nas suas respostas às perguntas dele.
Quatro anos depois, ela está menos indócil e mais contida, mas não mudou em outros aspectos: ela ainda se consulta o tempo todo com a mãe, que a criou sem um marido, e com o irmão mais velho Trevor, que lhe ajuda a treinar para os papéis. Ela afirma, contudo, que tem a responsabilidade final pela escolha dos personagens e pela maneira de interpretá-los.
— Ninguém me coloca nessa roda viva, só eu. Eu sou a mão mais pesada que faz pressão sobre mim mesma — comenta Chloë.
Roteiro fez atriz chorar sem parar
Soderbergh argumenta que chegou a uma conclusão parecida sobre a moça quando começou a conversar com ela sobre “A biblioteca” no fim do ano passado e encontrou uma atriz que ansiava por mais do que as experiências fragmentárias que o cinema tinha lhe proporcionado.
— Trabalhar num filme é uma prática inatural — afirma Soderbergh, cuja experiência nos palcos se limitava a produções para a Universidade do Estado da Louisiana e para a Sydney Theater Company, na Austrália. — Aqui, ela tem a chance de viver um personagem do começo ao fim toda noite. Há um prazer que isso traz, em ter uma resposta do público e descobrir que cada performance tem um colorido diferente.
Para esse papel, Soderbergh alegou ter voltado os olhos para Chloë motivado pela “relação de tudo o que ela tinha feito nos últimos três ou quatro anos” e pela reputação imaculada que ela preserva em Hollywood.
Ainda assim, quando Teri e Trevor Moretz foram abordados com a proposta para ela participar de “A biblioteca” (cujo elenco inclui também Jennifer Westfeldt e Lili Taylor), eles disseram a Chloë que a peça seria encenada em Chicago — apenas para garantir que ela se interessaria genuinamente pelo roteiro, e não pela fama de seus criadores ou por uma viagem a Nova York.
Antes de saber a verdade, a atriz ficou fascinada pela história que dramatiza as consequências de um tiroteio e não o tiroteio em si, além de não pregar contra ou a favor do controle de armas.
Mais tarde, durante os ensaios, ela disse:
— Eu cheguei em casa um dia e não consegui parar de chorar. Nunca fui tão afetada por um filme. Somente uma peça pode fazer isso.
A atriz Julianne Moore, que fez o trágico papel da mãe da personagem de Chloë no remake de 2013 de “Carrie, a estranha”, diz que se surpreendeu com a habilidade dela de “buscar vínculos, em vez de repulsão, naquela assustadora dinâmica de mãe e filha”.
— Eu fiquei pasma com a maturidade emocional dela e com sua disposição para explorar as complicações do papel. Geralmente, jovens atores chegam com respostas pré-concebidas e com uma atuação fabricada. Chloë é disponível, sensível e presente — elogia Julianne, por e-mail.
Quando concluir sua educação doméstica, receber o diploma do ensino médio pelo correio e fizer 18 anos, em 2015, Chloë prevê:
— Não farei 50 cenas de sexo, com nudez total. Isso não vai acontecer.
Em vez disso, ela quer buscar papéis apropriados para seu desenvolvimento como atriz e pretende continuar a trabalhar com a mãe e o irmão.
— Não me sinto sufocada. Não sinto que não tenha experimentado as coisas. Experimentei mais. Eu seria uma idiota de dizer: “valeu, pessoal! Obrigado por nada!” — pondera ela.
Em contraste com o tom adulto, ela conta que irá ao baile de formatura de uma amiga.
— É divertido — explica.