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'A burocracia te deixa de mãos atadas', diz Guti Fraga sobre seus seis meses na Funarte

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RIO - Guti Fraga usa um verso de Drummond — “‘No meio do caminho tinha uma pedra’, mas a gente segue adiante” — para resumir o seu trabalho até agora na presidência da Fundação Nacional de Artes (Funarte), cargo que ocupa desde setembro. No gabinete do 5º andar do Palácio Capanema, no Centro do Rio, o ator e diretor teatral de 61 anos diz que dificuldades orçamentárias e burocráticas têm emperrado a distribuição de verba do principal braço do Ministério da Cultura (MinC) destinado a fomentar as artes. Com as eleições deste ano, ele lembra que entrega o cargo no fim de 2014. Enquanto isso, afirma que está investindo em formação de plateia e promete buscar parcerias e mecanismos para reduzir a burocracia no órgão.

Seu maior obstáculo até aqui, diz, é o contingenciamento de verbas que congelou o lançamento de quatro importantes editais, num total de cerca de R$ 15 milhões: os prêmios Carequinha (circo), Klaus Vianna (dança), Artes na Rua e o de ocupação dos Centros de Artes e Esportes Unificados, todos anunciados como prioridades em sua cerimônia de posse, ao lado da ministra da Cultura, Marta Suplicy. Procurada pelo GLOBO, a pasta respondeu que “os recursos contingenciados atingem o MinC como um todo. No caso do Fundo Nacional de Cultura, os recursos liberados para a Funarte têm como referência o montante de recursos utilizados em 2013, tendo sido os projetos priorizados pela própria Funarte”.

Atualmente com dez editais em avaliação e oito recém-abertos, Fraga, fundador do grupo Nós do Morro, espera solucionar “logo depois do carnaval” as pendências que impedem tais publicações.

— Você chega e acha que vai poder delirar e inventar uma série de coisas, mas aqui dentro a realidade é outra.

Abaixo, os principais trechos da entrevista de Guti Fraga ao GLOBO.

Como avalia o início de seu mandato na Funarte e a relação entre seus planos e as possibilidades oferecidas pelo Ministério da Cultura?

Eu cheguei aqui sem ter tempo de pensar ou analisar a real situação da Funarte. Fui levado por uma força, pela possibilidade de ampliar meu conhecimento sobre a produção de cultura no país, porque o raio de ação da Funarte é gigante, e também era preciso entender melhor a relação com o MinC.

Mas o que foi posto em prática desde então?

Cheguei num momento em que tudo (referente ao ano de 2013) já havia acontecido, mas com três grandes editais pendentes, o Carequinha, o Klaus Vianna e o Artes na Rua. E isso gera uma pressão enorme, mas as dificuldades internas e burocráticas te deixam de mãos atadas. Você chega e acha que vai poder delirar e inventar uma série de coisas, mas aqui dentro a realidade é outra. Você encontra editais parados, plano de ações...

Na cerimônia de posse, a ministra Marta Suplicy anunciou que iria liberar as verbas para esses três editais, mas até agora nenhum deles foi lançado.

Internamente, estamos com eles todos prontos, mas houve um contingenciamento enorme, fora impedimentos burocráticos que estamos desemperrando. Estamos no fim de uma formalização com a Caixa, que irá disponibilizar R$ 6 milhões dos R$ 10 milhões (para o edital do Carequinha). Na semana passada, participei de uma reunião sobre o Fundo Nacional de Cultura. Tratamos da urgência em liberarmos essas verbas. Isso vai acontecer logo após o carnaval. O Carequinha é a nossa prioridade máxima, e logo depois os outros.

Enquanto isso, o que pode ser feito?

Quando soube do contingenciamento, comecei a fazer o que podia aqui dentro. Reativamos a Sala Sidney Miller, que está bombando com uma programação de shows a mais eclética possível, atraindo um público supervariado. Comecei a trabalhar a relação de todos os funcionários da casa com as artes. É preciso seduzir as pessoas para que elas frequentem o teatro, para que conheçam a programação. Uma das principais missões da Funarte para este ano é a formação de novos públicos, queremos triplicar a presença das pessoas nas salas da nossa rede. Eu e a ministra estamos organizando projetos focados na juventude, na construção de bases para a formação de público e jovens artistas.

E como lida com a pressão externa, com a cobrança pelos editais?

O que posso fazer é ser como sou, um cara aberto ao diálogo. Assim que entrei na Funarte deixei claro que aqui não tem religião ou partido, ideologia, o que importa é a arte.

Fora esses três editais, há o de ocupação dos CEUs, que também foi anunciado, mas não lançado. Ele ofereceria R$ 100 mil para 80 projetos, 27 ainda em 2013 e 53 em 2014. Algum foi realizado? Ou todos ficaram para 2014?

Ele está em avaliação, ficou para este ano também. É um projeto em que acredito imensamente, admiro muito a Marta pela criação dos CEUs, o que foi um dos fatores fundamentais para eu aceitar o convite dela. É um projeto que une cultura e educação, dois pilares para qualquer transformação. Você vai num CEU na periferia e vê a dignidade daquilo, cabe uma peça, uma orquestra. É um espaço que permite transformação sem paternalismo.

Para além da liberação dessas verbas, há mais dinheiro a ser investido na criação de outros projetos? Em 2012, por exemplo, o Mambembão (que contempla produções de dança e teatro do país) teve seu retorno anunciado com pompa, mas no ano seguinte não aconteceu. Pensa em reativá-lo?

Seria um sonho, como tantos outros, mas realmente não há verba para ele e nem para criar outros. Estou desde dezembro sem um diretor executivo, agora que estamos contratando outro. É punk, mas estamos lutando.

Se a Funarte não conta com mais verbas, o que fazer para ir além do que já está estipulado?

Eu não quero fazer uma gestão para quitar o que havia sido anunciado, isso é muito fraco, é pouco. Estamos correndo atrás de parcerias com empresas de diversos setores. Em meio a um contingenciamento, em um período espremido entre Copa, eleições e Olimpíadas, sem verba... O que fazer? É preciso correr atrás de parcerias. E trabalhar para desburocratizar mecanismos de fomento já existentes.

Você estava prestes a estrear uma peça (“Tudo ou nada”, com texto de Luiz Eduardo Soares e direção do colunista do GLOBO Marcus Faustini) quando assumiu a Funarte. Pretende encená-la ainda neste ano?

Não tive como equilibrar a Funarte com a peça. Eu quero fazer, porque é uma peça maravilhosa, muito forte. Ela vai marcar a minha saída da Funarte. Quero fazer esse espetáculo na minha despedida.

Então não é pra já?

Saio da Funarte no final do ano, né? Acaba o governo, a gestão da ministra, eleições...

E o que pretende fazer a partir de então?

Assim que encerrar meus compromissos aqui, volto pra cena.


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