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Crítica: Gustavo Galo, o romântico possível

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RIO - Curioso o número de referências que saltam, citadas nominalmente, nas canções de “Asa”, disco de estreia solo do paulistano Gustavo Galo. Cantor e principal compositor da Trupe Chá de Boldo, o artista lista ao longo das onze faixas nomes como Patti Smith (“Um garoto”), “Rita Zeca Cauby Mutantes” (“Cantei, cantei”), Noel Rosa (“Asa”), Leonard Cohen (“Cama”) e Clementina de Jesus (“Nosso amor é uma droga”). Mas Galo não usa do procedimento para traçar uma teia-bula que supostamente explicaria sua música. É bem mais interessante que isso — o artista é mais que uma soma das referências.

O compositor carrega — seja desenvolvido do zero, seja trazido da combinação de suas influências citadas ou das que dispensam a citação, como Walter Franco, de quem ele grava “Eu te amei como pude (Feito gente)”, e Tom Zé, de quem se aproximou ao participar do EP “Tribunal do feicebuqui"— o romantismo possível, o drama tornado leve pela autoironia ou pelo olhar distanciado que os personagens lançam sobre si mesmos. Não há cinismo, porém. A frase de Franco “Eu te amei como pude” é, nesse sentido, uma síntese da equação romantismo-realidade.

Em “Tomara”, por exemplo, a imagem forte do “Enterrei meu coração numa praça” é suavizada pelo humor (triste, mas humor) do “organizo saraus de vermes/ Aos sábados/ Domingos/ Feriados” e pela conclusão sobre o coração enterrado: “Tomara que nasça” .

Os exemplos são muitos. Há a declaração de amor sem peso, mas contundente, de “Cama” (“Se eu decidir ficar/ Sonhe com algo bacana/ Faça de conta que vai/ Tudo bem”). Ou o alerta da distância que se estabeleceu entre o casal em “Só”: “Eu só sei/ Que a sala ficou imensa/ (...) Eu só sei/ Que viver só não consigo”. Galo tem a companhia de parceiros como arrudA, Peri Pane e Marcelo Segreto. Outros nomes se agrupam no disco, que traz entre seus convidados Lirinha, Alzira E., Mauricio Pereira e Ava Rocha.

Apoiando as letras, a música de Galo. Cultor da canção, ele cruza os caminhos de Chico Buarque e dos malditos, as trilhas do brega dos 1970 e da São Paulo mais cool dos 2000 — sempre mirando o encontro verso-melodia. A produção de Gustavo Ruiz e Tatá Aeroplano é primorosa, não só pela navegação por diversos gêneros como também pelo uso de timbres originais dentro deles — ouça o classic rock funkeado de “Eu te amei como pude”, com cello, Rhodes e guitarra fuzz, ou o minimalismo épico de “Asa”. É a faixa-título aliás, que encerra o belo disco — que começara com um coração enterrado — com o verso “A terra goza”.

Cotação: Bom


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