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Livro que rendeu Man Booker Prize a Hilary Mantel chega ao Brasil

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RIO - Esta semana, chega às livrarias brasileiras um livrão — literal e metaforicamente. “O livro de Henrique”, um dos maiores fenômenos literários do ano passado, rendeu à autora inglesa Hilary Mantel o Man Booker Prize, principal prêmio de literatura da Comunidade Britânica. Ela foi a primeira mulher a vencê-lo e o único autor inglês a conquistá-lo duas vezes.

Lançado pela Record, o livro é o segundo de uma trilogia sobre Thomas Cromwell, o poderoso ministro do rei Henrique VIII. Depois de ganhar outros prêmios, a obra vai virar peça de teatro, produzida pela Shakespeare Company, e série de TV, na BBC de Londres.

Embora Cromwell continue no centro da trama, “O livro de Henrique” conta os bastidores da decapitação de Ana Bolena, mulher de Henrique VIII. Para ficar com ela, o rei rompeu com o Papa, já que era casado com outra. O divórcio, não permitido por Roma, fez a Inglaterra mergulhar em um isolamento, e Henrique, na culpa e no medo de ir para o inferno.

Mas Ana Bolena, após fazer o marido brigar com a Igreja, fracassou no que se esperava dela: não conseguia ter um filho homem, impedindo a perpetuação da dinastia dos Tudor.

Um dia, Henrique VIII trai a rainha com a jovem Jane Seymour. E se apaixona. A partir daí, começa a pensar em um jeito de se livrar de Ana Bolena. Cromwell, um filho de ferreiro que deve sua ascensão social à rainha, é o encarregado de usar suas habilidades políticas para se livrar dela. O fim é conhecido: Ana Bolena é decapitada. Uma morte chique para a época, já que só pessoas importantes recebiam essa honra. Aliás, vem daí o título original do livro, “Bring up the bodies”, algo como “Tragam os corpos”, expressão usada em execuções no século XVI.

A escritora tentou conhecer as emoções de seu protagonista, um homem que ela julga inteligente, criativo e solidário; mas também uma águia política. Talvez por isso, ele seja reconhecido por muitos como vilão. Mantel não quis abraçar o preconceito.

— Eu me senti atraída por Cromwell por ele ser uma das figuras centrais da corte na época. Mas sua história nunca havia sido contada em detalhes. E ele é tratado como alguém tramando planos diabólicos. Antes de ser ministro do rei, ele era um João Ninguém — diz Hilary.

A história podia ser um novelão medieval, se a autora não escrevesse bem. O livro impressiona pelos detalhes não só dos ambientes, mas também da mente dos personagens. Um dos aspectos curiosos sobre Cromwell são suas águias treinadas, batizadas com o nome de suas filhas mortas. Ao descrever a conspiração contra Ana Bolena, em que boatos de adultério são alimentados por Cromwell, Hilary passeia pela rede de intrigas sexuais da corte.

— Faço muita pesquisa, acho que devo isso ao meu leitor. Não basta saber que roupas os personagens vestiam. É preciso conhecer o pano de fundo cultural deles — afirma. — Não sou historiadora, não tive acesso a diários secretos nem a cartas perdidas. Estudei a história e deixei a imaginação fazer o resto.

Não à toa, Hilary é apontada como renovadora do gênero.

“Ela reescreveu a ficção histórica”, disse Peter Stothard, presidente do júri do Man Booker Prize, na época da premiação.

Problemas de saúde

Sozinha, a vida da autora já dava um livro. Ela decidiu virar escritora aos 22 anos, logo após a faculdade. Fascinada pela Revolução Francesa, Hilary lamentava não encontrar um bom romance sobre o assunto. Resolveu escrever um: “À sombra da guilhotina”, publicado também pela Record.

Por trás da decisão, a saúde. Naquela idade, Hilary foi diagnosticada com um transtorno psiquiátrico. Depois de ser internada, começou tratamento com remédios antipsicóticos. Diferentemente do esperado, as drogas produziram delírios psicóticos.

Mais tarde, morando na África com o marido, ela descobriu uma endometriose, que a obrigou a retirar o útero. Além de ficar estéril, engordou em excesso. Entre uma crise e outra, era impossível planejar uma vida profissional.

— Eu tinha projetado um futuro para mim, no Direito e, quem sabe, na política. Mas essas carreiras exigiam mais força do que eu tinha. Passei a pensar numa profissão que me fizesse ser lembrada. Essa profissão era a escrita — ela diz. — E foi a decisão certa, porque minha saúde continuou a piorar.

O gosto pelo passado nasceu na infância. Quando criança, Hilary passava muito tempo com os parentes mais velhos. E os ouvia, encantada, falarem dos mortos como se estivesse vivos, “capazes de andar pela sala”.


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