E não faltou nem fogueirinha (cenográfica) na noite solo, de música para acampamento, que o vocalista do grupo americano Pearl Jam, Eddie Vedder, proporcionou ao Citibank Hall, no Rio, na noite de domingo. A casa, com sua lotação esgotada (2900 pessoas, todas sentadas, já que era uma ocasião teoricamente mais calma) fez um grande alvoroço para receber o cantor em sua versão mais descontraída e – como não? – mais íntima, aliviado que estava daquela barreira que a banda costuma criar, com suas exigências de grande nome internacional do rock de arena.
Num palco cheio de instrumentos e bugigangas que pareciam ter sido arrecadas em uma loja de penhor, Eddie, de 49 anos, navegou, com a intensidade e a generosidade de um Bruce Springsteen por um vasto e nada convencional repertório. Boa parte dele veio de seus trabalhos solo, como as canções “Setting forth”, “Guaranteed” e “Far behind” (todas da trilha que ele fez em 2007 para o filme “Na natureza selvagem”), nas quais ele oscilou entre a pegada mais roqueira, descendo a mão no violão, e outra mais delicada, dedilhada. Por vezes, o cantor recorreu ao ukulele, espécie de primo do cavaquinho, com o qual fez seu outro álbum solo, “Ukulele songs”, de 2011.
Divertido, comunicativo e com aquela sua voz inconfundível (muitas vezes imitada, nunca superada), Eddie Vedder ganhou o público para as suas composições fora do Pearl Jam. Mas seu carisma gente-como-a-gente costuma render muito mais se vier acompanhado de algumas canções conhecidas. E a noite começou com uma delas, “Brain damage”, do disco “The dark side of the moon”, do Pink Floyd, levada por ele na guitarra elétrica. Mas foi só uma vinhetinha. Mais à frente, o cantor ainda releu um Cat Stevens, “Trouble”, que assentou bem no seu repertório.
Analisando suas sempre mutantes listas de canções dos shows solo (especialmente as dos três que ele fez pouco antes, em São Paulo), não dava mesmo para esperar muitos grandes sucessos do Pearl Jam. Mas, na primeira noite no Rio (ele se apresenta no Citibank também na segunda-feira), Eddie não abriu mão, pelo menos, de cantar “Better man”, “Immortality” e “Elderly woman behind the counter in a small town”. E foi saudado entusiasticamente por esses números.
Os covers, porém, é que acabaram dando personalidade e brilho à noite desse Eddie Vedder solto na vida. “You’ve got to hide your love away” (Beatles), “I believe in miracles” (Ramones), “The needle and the damage done” (Neil Young) e “4th of July” (do X, lenda do punk rock californiano, que abriu os shows brasileiros do Pearl Jam em 2011) garantiram aplausos na estreia carioca. E “Should I stay or should I go”, do Clash, que o artista levou no ukulele, foi a deixa para que ele recebesse no palco um rapaz da plateia e até o deixasse cantar junto com ele. Meet & greet total.
Junto com o cantor e violonista irlandês Glen Hansard (conhecido pelo filme “Apenas uma vez”, que fez um divertido e embriagado número de abertura), Eddie foi responsável, mais adiante, por uma arrepiante interpretação a capela de “Sleepless night”, dos Everly Brothers. E novamente com Glen, ele foi de “Falling slowly”, música da banda do moço, o Swell Season. Alguns minutos adiante, apesar do tanto de músicas que o público nem sempre educadamente insistia em pedir, era a hora de ir. E o numero de encerramento da noite vedderiana, já com duas horas e dez minutos de duração, foi escolhido a dedo: a clássica canção americana “Dream a little dream of me”, mais uma vez com o cantor no ukulele. Momento singelo de um show de muitas surpresas.
Cotação: bom