RIO — No final da noite do dia 5 de agosto de 1954, o jornalista e político Carlos Lacerda (1917-1977) e seu filho Sérgio, então com 15 anos, chegam de um comício à portaria de seu prédio, na Rua Tonelero, em Copacabana, no carro do major da Aeronáutica Rubens Vaz, que fazia a escolta pessoal de Lacerda. Ao saírem do veículo, uma figura surge das sombras do outro lado da rua e dispara tiros contra o grupo — um deles atinge o major, mortalmente, no peito. O episódio, que marcou o início da derrocada do governo Getúlio Vargas, entrou para a História como o Atentado da Rua Tonelero.
As primeiras investigações levam até o Palácio do Catete, antiga sede do governo brasileiro, e apontam para Gregório Fortunato, chefe da guarda pessoal de Vargas, como o mandante do crime. Insatisfeitos com a distância que o presidente tomara das Forças Armadas, que o apoiou em seu primeiro período à frente do governo, entre 1930 a 1945, os militares usam o incidente para engrossar o discurso anti-Vargas, que ecoava nos ataques de Lacerda, seu principal opositor político, e na imprensa.
Preocupados com as inclinações populares do presidente — que concedera, em fevereiro daquele ano, um ajuste de 100% ao salário mínimo —, os militares pressionam por sua renúncia. Diante da crise crescente, em 23 de agosto, Vargas reúne-se com seus ministros no Palácio do Catete, em encontro em que fica decidido que o presidente entraria em licença até o final das investigações sobre o atentado.
Duas horas mais tarde, já na madrugada do dia 24, o irmão de Vargas, Benjamin, chega ao Palácio do Catete com a informação de que os militares queriam mesmo era a renúncia do presidente. Irritado, Vargas diz que “só sairá morto do Catete” e se retira para seus aposentos. Momentos mais tarde, ele é encontrado em seu quarto com um tiro no peito. Dez anos depois, as mesmas forças contrárias a Vargas apoiaram o golpe militar que depôs o então presidente João Goulart.
Saída “nos braços do povo”
Getúlio Vargas vinha de uma trajetória singular. Gaúcho de São Borja, deu baixa no serviço militar com a patente de sargento e foi estudar na Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre, atual UFRGS. Comandou a Revolução de 30 até chegar ao poder, à força de uma ditadura, em 1937. Deposto em 1945, voltou cinco anos depois pelo voto popular. Na morte, Getúlio recupera sua estatura de estadista popular, saindo do Palácio do Catete nos braços do povo que o elegeu: seu velório e o cortejo de seu corpo até o aeroporto atraiu milhares de pessoas.
Personagens históricos
Carlos Lacerda: Vivido por Alexandre Borges no filme 'Getúlio', foi grande opositor de Vargas. Pivô da crise política que culminou no suicídio do presidente.
Alzira Vargas: Filha e conselheira política de Vargas, ela (no filme, Drica Moraes) ajuda o pai durante a crise e é quem o encontra morto.
Gregório Fortunato: Chefe da guarda pessoal do presidente (vivido por Thiago Justino), é descoberto como o mandante do atentado contra Carlos Lacerda.