Quantcast
Channel: OGlobo
Viewing all articles
Browse latest Browse all 32716

Francesa desenha cotidiano do Rio

$
0
0

RIO - Em 1816, desembarcou no Rio de Janeiro um grupo de artistas franceses com a missão de fundar a primeira academia de arte no Brasil. Enquanto a instituição não era criada, a trupe formada por Lebreton, Debret, Pradier, Montigny e os irmãos Taunay passou dez anos retratando o Brasil, suas paisagens, seus personagens e seu cotidiano.

Quase 200 anos depois, chegou ao Rio de Janeiro uma ilustradora francesa com uma missão bem mais pessoal: conhecer a fundo o país natal de seu pai, viver aqui um bom tempo e ser feliz, claro, já que estava viva e passava bem. Enquanto tentava cumprir seu objetivo, Johanna Tomé de Souza, de 27 anos, fez um trabalho semelhante ao da famosa Missão Artística Francesa, sem sequer conhecer este capítulo da nossa História. Passou os dias retratando a cidade, suas paisagens e seu cotidiano.

Em aquarela, Johanna fez ilustrações da comemoração dos resultados de jogos de futebol no Baixo Gávea, das cerimônias religiosas na Baixada Fluminense, do baile de gafieira da Estudantina, mas também das enchentes, da ocupação da Aldeia Maracanã por manifestantes e dos protestos que marcaram o ano de 2013. O resultado do trabalho será exposto a partir de 28 de março no Atelier Richelieu, em Paris, durante a Paris Contemporary Drawing Fair.

— Já tinha feito pequenas exibições, mas esta certamente é diferente. É o resultado de uma experiência incrível que foi passar os três últimos anos no Brasil, entender o quanto de mim é brasileira, o quanto é francesa — comenta Johanna, por Skype, de Paris. — Quero divulgar uma outra visão do Rio e do Brasil, não unicamente o meu trabalho.

A história dela tem início na cidade de Mococa, interior de São Paulo. Foi de lá que seu pai saiu, aos 21 anos, para estudar Psicologia na França. Em Paris, ele conheceu a mãe de Johanna, então estudante, onde vivem casados até hoje. Em casa a rotina era dividida: nunca faltou feijão e em todas as férias a família vinha visitar o Brasil. Johanna conhece a Amazônia, o interior do Tocantins, as praias do Nordeste. Mas quando voltava a Paris, em vez de escrever a redação “Minhas férias”, Johanna desenhava.

O talento foi notado logo cedo pela família, que a matriculou numa escola de desenho aos 15 anos. Em pouco tempo, a menina já fazia ilustrações para livros e revistas infantis. Antes dos 20, já era redatora gráfica de uma editora de publicações do tipo. Mas Johanna queria fazer mais do que desenhos por encomenda. Aos 25 anos, criou um blog sem contar para ninguém. E ali começou a publicar desenhos livres.

— Mudou tudo quando comecei a desenhar no blog. Fazia um desenho por dia, sem temas específicos ou obrigação. É muito importante essa liberdade para ir formatando sua própria linguagem — explica ela.

À época, terminava o curso superior de Artes Plásticas. Aos anseios de chegar a um estilo próprio juntou-se a vontade de conhecer mais suas raízes brasileiras. Tomou o avião para o Rio em 2010 com duas malas de material de desenho (ela diz que os preços no Brasil são impraticáveis). A ideia era passar um ano. Acabou ficando três. E pretende voltar em abril para morar de vez:

— No início eu não sabia muito bem me posicionar. Estranhava tudo: o trânsito, a burocracia, eu sabia que tinha coisas boas para viver aqui, mas não conseguia encontrar. Foi quando comecei a desenhar o cotidiano da cidade.

E como desenhou. Nas telas, não deixa escapar um só detalhe: dos letreiros do ônibus desejando “Feliz Natal” em meio à enchente aos catadores de latinha que passeiam invisíveis em festas ao ar livre. Dias como o do “toque de recolher” imposto pela Polícia Militar na Lapa (20 de junho) ou da derrubada da Perimetral também foram detalhados.

— Eu cresci participando de manifestações na França. Naturalmente, fiz amigos mais engajados no Brasil, e pude participar de tudo o que acontecia. Mandei muitos relatos para os jornais franceses — conta ela, que teve alguns desenhos publicados no “Le Monde”.

Nem sua última noite no Rio escapou: ela tinha marcado sua despedida com amigos na Casa da Cachaça, na Lapa, quando uma chuva a deixou ilhada por três horas na calçada estreita do local. Tudo pode ser conferido na sua página www.facebook.com/johannatdsarts.


Viewing all articles
Browse latest Browse all 32716


<script src="https://jsc.adskeeper.com/r/s/rssing.com.1596347.js" async> </script>