BERLIM - Está logo no primeiro capítulo de “Cuidado da piedade”, livro lançado pelo escritor austríaco Stefan Zweig em 1939, a motivação do diretor americano Wes Anderson para escrever e dirigir “The Grand Budapest Hotel”, o oitavo longa de sua carreira, que teve sua primeira exibição nesta quinta-feira, na abertura do Festival de Berlim. O trecho que mais interessou Anderson na obra de Zweig, utilizado quase literalmente no filme, diz que um escritor não precisa correr atrás de histórias. Deve, ao contrário, “deixar-se encontrar por personagens e acontecimentos”.
Foi assim com o jovem escritor interpretado por Jude Law em “The Grand Budapest Hotel”, o narrador de uma história passada na década de 1930, que lhe é contada por Zero Moustafa, rapaz que começa sua trajetória no hotel do título como ajudante (papel do estreante Tony Revolori) e termina como proprietário (na pele do experiente F. Murray Abraham). E foi assim também com Anderson, quando se deparou com a obra de Zweig, cujo nome aparece nos créditos como a inspiração para o diretor escrever seu roteiro.
— Adoro esse trecho do livro. É um jeito simples de começar a contar o que está por vir. As histórias do livro e do filme não estão relacionadas, mas me inspirei no ambiente criado por ele. Foi mais ou menos um plágio — brincou Anderson, na coletiva de imprensa que se seguiu à exibição. — É curioso porque Zweig nunca foi popular em inglês. Apenas nos últimos anos uma editora de Nova York passou a relançar seus livros, mas muita gente não o conhece. O que, para os europeus, parece absurdo.
O ambiente da história remete ao período próximo ao início da Segunda Guerra, quando já era possível perceber a movimentação de tropas e o clima de suspeita no ar. A trama central mostra a história do talentoso concierge Gustave H. (Ralph Fiennes), que sempre é muito carinhoso com as mulheres mais velhas e acaba aparecendo no testamento de Madame D. (Tilda Swinton, irreconhecível), quando ela é assassinada.
Mas, como acontece com os filmes de Anderson, há uma estética própria: a câmera pouco se movimenta, os personagens costumam falar em close, observando o espectador, há planos e contraplanos, e a direção de arte deixa bem claro quem é o cineasta por trás da obra.
No Brasil, estreia em abril
Além disso, Anderson consegue como poucos reunir um time gigante de estrelas, muitos para participações mínimas. Não caberiam todos os atores de “Grand Budapest Hotel” nesta página, mas vale citar Edward Norton, Bill Murray, Adrien Brody, Willem Dafoe, Léa Seydoux, Saoirse Ronan, Harvey Keitel, Mathieu Amalric, Jason Schwartzman e Owen Wilson.
— Ele promete para a gente muitas horas de trabalho a salários baixos e pão dormido — disse Murray. — Por exemplo, quando fiz “O fantástico Sr. Raposo”, que é uma animação, tive que passar uma semana na Inglaterra para gravarmos 20 minutos em estúdio. Depois ele me fez ir para Paris, ficar uns 8 dias, para mais 20 minutos. Ao menos conseguimos conhecer o mundo e ainda ajudamos Wes a ter essa vida mágica em que transforma seus sonhos em realidade.
“The Grand Budapest Hotel” foi rodado na Alemanha, em coprodução entre o país e a Inglaterra. Ele é o primeiro dos 20 filmes em competição pelo Urso de Ouro, exibidos até o dia 16. No Brasil, o filme de Anderson tem previsão de estreia para 4 de abril e deve gerar expectativa grande, considerando a legião de fãs que o cineasta de 44 anos acumulou com longas como “Os excêntricos Tenenbaums” (2001).
— É muito raro estar numa produção em que se permite que o diretor faça exatamente o filme que quer fazer — elogiou Fiennes, que teve em “Grand Budapest Hotel” seu primeiro trabalho com Anderson.
André Miranda está hospedado em Berlim a convite do festival.