RIO - Comum nos Estados Unidos, a transição de seriados para o cinema é cada vez mais frequente no Brasil. E, embora não necessariamente um bom programa de TV vire um filmaço, o público parece aprovar o trajeto. Lançado em 2003, “Os normais”, derivado da série homônima estrelada por Fernanda Torres e Luiz Fernando Guimarães, levou 2,9 milhões de espectadores ao cinema. O sucesso rendeu a sequência “Os normais 2 — A noite mais maluca de todas”, seis anos depois, em 2009. A terceira parte do longa já está entre os planos do do diretor José Alvarenga Jr. e dos autores Fernanda Young e Alexandre Machado.
— A gente tem um pré-roteiro escrito, e a história é incrível porque é um falso documentário sobre o que aconteceu com Rui e Vani. Então temos 50 milhões de versões, a linguagem é de documentário e é bem sacado. A questão é conciliar o tempo de todo mundo — adianta Alvarenga.
O diretor conta que a ideia inicial de levar as histórias de Rui e Vani para as salas de cinema veio do produtor Bruno Wainer, na época executivo da Downtown Filmes.
— Bruno achou que renderia uma boa comédia e quis investir dinheiro no projeto. Se não fizéssemos, ficaríamos culpados. E foi daí que saíram as bases para a nova comédia brasileira, que está enchendo os cinemas agora — valoriza ele, que, na TV, dirigiu séries como “A diarista”, “Divã”, “Macho man”, “Força tarefa” e “O dentista mascarado”.
Alvarenga diz que, embora a tela grande possibilite novas experimentações — algumas até impensáveis na TV —, o essencial é saber diferenciar cada mídia para que o filme não seja simplesmente “um episódio mais longo do que é exibido na TV”.
— Enquanto o produtor já sabe que há um público testado ali, o diretor precisa ter consistência e ser capaz de separar as linguagens. O importante é que a qualidade de cada veículo seja preservada — analisa.
Diferença de linguagem
Foi esse know how que Alvarenga levou para “Cilada.com”. E deu certo. O filme, de 2011, angariou quase 3 milhões de espectadores. As situações já vividas por Bruno Mazzeo nas seis temporadas da série do Multishow foram esquecidas, e o roteiro, que parte da mesma premissa, priorizou uma história romântica, pouco vista nos 53 episódios.
— Alvarenga me segurou em algumas expressões que funcionavam na TV, mas que, na tela grande, poderiam soar exageradas — diz Mazzeo.
Segundo o ator , o desejo de levar seu “Cilada” para o cinema era antigo. E ganhou força, ele conta, após a produção de “Muita calma nessa hora”, também de sua autoria. Porém, a continuação não está entre os planos do ator/autor, ele avisa.
— Estávamos entrando no cinema no mesmo momento em que me desinteressei em continuar fazendo o programa. A maior preocupação é mesmo não deixar parecer um episódio esticado. Isso seria até traição com o público. Filme baseado em seriado, acredito, deve ter algum diferencial. Nem que seja um tradicional antes e depois — analisa Bruno, que estreia “Muita calma nessa hora 2”, no fim do ano.
Lançado em 2007, “A grande família — O filme” foi a segunda maior bilheteria daquele ano, perdendo apenas para “Tropa de elite”. Com roteiro de Claudio Paiva e direção de Mauricio Farias — dupla também por trás de “Tapas & beijos” —, a produção mantém os mesmos personagens do seriado que está há 12 anos no ar.
— Quando fizemos o filme, percebemos que num longa havia a oportunidade de aprofundar uma história que, na TV, não tínhamos tempo suficiente para contar — explica Paiva.
Se “Os normais”, “A grande família” e “Cilada” são exemplos bem-sucedidos dessa transição, a estreia de “Seus problemas acabaram!!!”, da trupe do Casseta & Planeta, não teve o mesmo êxito. Apesar da credibilidade dos anos a fio na grade da Globo, o longa dirigido por José Lavigne e exibido em 2006 não agradou a público nem crítica.
— O filme trazia esquetes e não dramaturgia. Acho que faltou uma linguagem mais parecida com a do cinema. Se você pega uma novela de sucesso e coloca na tela grande, duvido que vá bem. O cinema é outra mídia — reforça Paulo Sérgio Almeida, diretor do site “Filme B”.
Almeida acredita na ideia da “confluência de mídias”. Ou seja: não dá mais para pensar separadamente.
— É uma alimentando a outra. Você pode se utilizar do cinema para testar a TV e vice-versa. Ainda mais porque o cinema vive do imediatismo do fim de semana e formar uma marca saindo do zero é muito difícil, principalmente quando se trata de crianças e adolescentes — analisa Paulo Sérgio.
Profissionais experientes
Assim como no caso de Crô, “Giovanni Improtta”, lançado no início do ano, não caiu em mãos desconhecidas. Foi dirigido pelo próprio José Wilker, que estrela a produção. E, se depender de Aguinaldo, a próxima a ganhar as telas é Nazaré Tedesco, vilã de Renata Sorrah, de “Senhora do destino”.
— Gostaria de saber o que aconteceu depois que ela se jogou do alto da ponte sobre o Rio São Francisco.
Márcio Fraccaroli, da Paris Filmes, frisa que cinema não é “negócio para amador”.
—Às vezes uma grande história fica presa no tempo. Para lançar um filme comercial tem que ser craque. É necessário bom produtor, bom diretor e que os talentos sejam bem escalados — analisa ele, contando que assiste a uma produção muitas vezes antes de lançá-la: — Assim você pode ver onde estão as reações do público. E os espectadores são duros. Se não gostarem do pôster e do trailer, não vão querer ver o filme — constata.