RIO — Advogado ou funkeiro? Para Matheus Moraes Torres, de 23 anos, mais conhecido como MC Théo, uma carreira não atrapalha a outra, pelo contrário, complementa. Cursando o sétimo período de Direito, ele se desdobra entre os shows e os estudos para manter a bolsa integral do Prouni na faculdade Estácio. Théo vê na advocacia a chance de garantir mais representatividade ao funk e de ajudar sua comunidade, o Morro de São Carlos, no Rio.
— O funk é motor para tudo na minha vida, inclusive para os estudos. Quero mudar as estatísticas, acabar com a marginalização desse movimento. Você pode ser estudado, falar bem e ser funkeiro — defende, para logo acrescentrar. — Como advogado, posso ajudar as pessoas que vivem dessa música e se expressam por meio dela. O funk tira muita gente da lama, gera renda, além de ser a única opção de diversão para muitos. Vou oferecer assistência jurídica aos MCs e às pessoas que moram no São Carlos. Volta e meia batem à minha porta para tirar dúvidas.
Théo é um ponto fora da curva num universo marcado por adversidades e carências. Abandonado na maternidade, viveu num orfanato até ser adotado, aos 9 meses, por Verônica e Rogério. O amor e o apoio dos pais não evitaram a adolescência conturbada. Já dormiu nas ruas, perdeu amigos para a violência, viu e viveu situações que deixariam muito marmanjo “de cara’’.
A paixão pela música foi sua “salvação’’. Influência da mãe, que é professora de dança. O Direito surgiu em sua vida há cinco anos, quando trabalhou como office boy num escritório de advocacia.
— Eu era meio estagiário, ia ao fórum. Então peguei gosto e decidi estudar para o Enem. — conta. Mas a dobradinha músico-estudante não é fácil, admite. — Já fui virado de um show para a aula. Durmo pouco. É complicado, mas não desisto.
No pequeno quarto que aluga com um amigo na comunidade, os livros ficam debaixo da cama por falta de espaço. Para estudar, ele prefere a biblioteca pública, mais silenciosa e fresca. A música é seu norte; e o Direito, uma ferramenta de transformação:
— Minha meta é terminar a faculdade, ter uma carreira que seja referência no meio musical e desenvolver um trabalho social na comunidade.
Composições no ônibus
A carreira profissional começou há cerca de dois anos, mas a lista de apresentações com artistas consagrados já é extensa. MC Théo já abriu shows de Alcione, Raça Negra, Nego do Borel, Sorriso Maroto, Mumuzinho, Xande de Pilares, entre outros grandes nomes.
— Minha primeira parceria foi com o Raça Negra, para mais de oito mil pessoas. Fiquei muito nervoso. Até hoje, sinto um frio na barriga quando abro o show de pessoas que sempre admirei e que são gigantes da música.
Além de cantar e dançar, Théo faz questão de compor suas próprias canções.
— Costumo compor quando estou no ônibus. Penso nas letras enquanto ouço as batidas. Falo de romance, traição, azaração, mas também da realidade da favela, assuntos relacionados a minha vida.
Entre um ponto e outro, já são mais de 40 composições. A mais recente, “Bum bum bum’’, está no Spotify. Com tudo isso, o MC ainda arranja tempo para dar aulas de dança gratuitas para a garotada do São Carlos.
— Organizo o plano de aula e a coreografia do espetáculo de fim de ano. É uma maratona, mas vale muito a pena. Em qualquer comunidade, a falta de oportunidades é a regra para os adolescentes. Por isso, é gratificante poder ajudar de alguma forma.
Curiosidade de um jovem MC
Aos 16 anos, ele começou a competir em disputas de Break-Hip Hop e a se apresentar com MCs, como Maneirinho e MC Marcelly.
Na Copa do Mundo
Em 2014, ele foi um dos destaques da festa de encerramento da Copa, dançando.
A família cresceu
Há pouco mais de dois meses, MC Théo se tornou pai. A filha, fruto do relacionamento com uma ex-namorada, se chama Ohana.
Ele não para
Por meio do “bolsa atleta’’, o MC ainda faz crossfit. Ele também cursa teatro na academia Vita De Atores, em Copacabana, com bolsa.
‘O rei’ dos 15 anos
MC Théo já tem 38 aniversários de 15 anos confirmados até abril de 2019. É uma boa fonte de renda para conciliar trabalho e estudo.